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Embora o cenário literário brasileiro, desde sua formação, seja ainda majoritariamente alimentado por obras de autoria masculina, é fato inegável que, a cada dia, testemunhamos ganhar os holofotes livros escritos por mulheres, que revelam uma percepção de mundo e uma elaboração estética da realidade impregnada de singularidades que apenas a subjetividade ligada ao olhar feminino poderia produzir.


Percebe-se, então, uma escrita que apresenta um repertório amplo e diversificado de temas, deslocamentos subversivos em relação às esferas hegemônicas ainda atuais e um sensibilidade muito particular vinculada a um modo de ser e de estar da mulher na sociedade, problematizando a forma como ela sempre foi vista ou representada culturalmente.


Por isto, na Literatura Brasileira, pode-se falar em Carolina Maria de Jesus, que, a partir do ponto de vista de uma mulher negra e da periferia, expõe a crueza e o sofrimento daqueles que vivem sob o jugo da pobreza, da condição desesperada pela busca da sobrevivência, daqueles relegados à margem da história, da literatura, da sociedade. Dela indica-se Quarto de despejo, que faz um retrato lúcido do que é ser pobre num país insistentemente desigual.


Outra escritora a ser lembrada aqui é Maria Valéria Rezende, uma freira escritora, cuja obra é marcada por um repertório intertextual, dialogando com várias outras literaturas, a convidar o leitor para um passeio por outras paragens junto a seus personagens. Assim, pode-se citar O voo da guará vermelha, obra que conta o encontro de Irene e Rosálio, unidos no decorrer da narrativa por meio da palavra, oralizada ou escrita, que ecoam as histórias de Sherazade, as andanças de Dom Quixote, entre outras pontes intertextuais. A palavra, sobretudo a literária, é que fortalecerá o laço entre os protagonistas citados.

Socorro Acioli, por sua vez, influenciada pelo realismo fantástico de Gabriel Garcia Márquez, elabora um retrato do sertão nordestino marcado pelo misticismo religioso em A cabeça do santo. Com base em um fato real, a escritora tece uma narrativa que gira em torno de uma cabeça de um santo que não foi encaixada no restante do corpo da estátua feita, um monumento inacabado situado na cidade de Candeia, desamparada e marcada pela indiferença sociopolítica. A partir de então, vê-se que, muitas vezes, a esperança continua sendo a última a morrer, quando o excluído não possui outra alternativa a não ser ter fé de que as coisas podem melhorar.


Para destacar mais uma, não se pode esquecer de Conceição Evaristo e da sua escrevivência, essa escrita que parte da própria vivência de quem sente na pele aquilo que está a narrar e que remonta a uma coletividade. Logo, na tessitura de Evaristo, há a exposição de experiências vividas por mulheres negras na sociedade brasileira, que sofrem com o preconceito de cor, de gênero, social, ferindo-a em todas as instâncias que lhes tocam. Diante disso, vale começar por Olhos d’água, conjunto de contos que delineiam muito bem a identidade literária da escritora em questão.

Claro, há Clarice, Cecília, Gilka, Rachel, Lygia, Adélia… são tantas mulheres mostrando que podem fazer literatura, e boa literatura, reflexo de um movimento de resistência no cenário literário brasileiro contemporâneo e que renova nosso cânone.

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Blogger, Andarilha na Literatura e Doutora em Letras. Colunista na Revista Entre Poetas e Poesias.

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